sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O Direito Penal do Inimigo e a tranquilidade social

                                                                 
                A teoria “Direito Penal do Inimigo” foi criada por Günther Jakobs, um doutrinador alemão, no início dos anos oitenta, em uma década onde o regime democrático surgia em diversos países. Porém, não sendo aceita, tal teoria permaneceu engavetada até o dia 11 de setembro de 2001, quando houve ataques terroristas às torres gêmeas, no Word Trade Center, em Nova York, nos Estados Unidos. Na manhã daquele dia, 19 terroristas da Al-Qaeda sequestraram quatro aviões comerciais a jato de passageiros. Os sequestradores intencionalmente bateram dois aviões contra as torres, matando todos a bordo e muitos dos que trabalhavam nos edifícios. O Direito Penal, então, passou a não ter como enfrentar o terrorismo e foi por essa razão que ressuscitaram a tese de Jakobs.
            Para entendermos tal teoria temos que analisar o ser humano sob dois aspectos: como cidadão e como inimigo da sociedade. Partimos da premissa de que todos nós somos cidadãos; ocorre que há a presença do inimigo social, que nasce cometendo um determinado crime grave, reincide no crime, passando a ser a criminalidade um hábito, ou seja, um meio de vida. Demonstra-se inimigo quando participa de organizações criminosas e ataques terroristas. Concluímos, portanto, que nem todo o criminoso é inimigo. Jakobs refere-se ao inimigo, em sua tese, “como alguém que não admite ingressar no Estado e assim não pode ter o tratamento destinado ao cidadão, não podendo beneficiar-se dos conceitos de pessoa”.  
            Jakobs constrói, com isso, dois conceitos de direito penal: o “Direito Penal do Cidadão” e o “Direito Penal do Inimigo”. O Direito Penal do Cidadão é aquele aplicado no Brasil, sendo visto como garantidor, devido ao respeito aos direitos e garantias individuais, consagrados na Constituição Federal, além de retrospectivo, pois tem como fundamento principal a culpabilidade do agente. O criminoso aqui só é preso pelo ato de execução do crime.  
            Já o “Direito Penal do Inimigo” é um direito autoritário, fundado na periculosidade daquele considerado inimigo, além de ser prospectivo, pois tem como fundamento a imprevisibilidade, ou seja, olha-se para o futuro, ao que pode acontecer, caso o inimigo permaneça solto, ameaçando a tranquilidade de toda uma sociedade. Aqui o agente criminoso é punido pelo que pode cometer contra a sociedade. Nesse novo direito penal, já aplicado por diversos países, vítimas de terrorismo - apesar de a tese ter sido defendida há mais de 20 anos, as penas indeterminadas foram ressuscitadas, onde há a antecipação da tutela penal, punindo os atos preparatórios do crime com o mesmo rigor e pena do crime consumado. Há a efetiva supressão de direitos e garantias fundamentais, ou seja, para esse criminoso não há o direito a ampla defesa, ao contraditório e, muito menos, a comunicação com advogado. Afinal de contas, estamos diante de um inimigo do Estado e da sociedade.
            No Brasil, diante de fundamentais princípios constitucionais, como o da “isonomia”, da “dignidade da pessoa humana”, da “presunção de inocência” e do “devido processo legal”, dentre outros consagrados na Carta Magna, podemos dizer que será impossível aplicar o “direito penal do inimigo” e isso porque a teoria de Jakobs se funda em três pilares antagônicos ao direito brasileiro: 1- antecipação da punição do inimigo; 2) desproporcionalidade das penas e relativização e/ou supressão de certas garantias processuais; 3) criação de leis severas direcionadas à clientela terrorista, delinquentes organizados, traficantes, criminosos econômicos, dentre outros, de alta periculosidade social.
            Finalizando, essa teoria vem tomando forma e espaço no mundo e o seu desenvolvimento global será como meio de controle social e pacificação. Ora, o sistema criminal tem que estar em concordância com a real necessidade de defesa de uma sociedade. Assim, será inevitável que haja em um futuro próximo a mitigação globalizada do princípio da legalidade, pois a periculosidade do inimigo impede a previsão de todos os atos que possam ser por ele praticados. Como podemos prever que um terrorista volte ao mesmo local do crime e pratique atrocidades relatadas na mídia nacional e internacional quase todos os dias? De um lado, temos o direito penal do cidadão, amplo e dotado de todas as garantias processuais e de outro, o direito penal do inimigo, em que o sujeito deve ser visto como fonte de perigo, sendo a sua eliminação da sociedade o objetivo do Estado como fator de tranquilidade social.   

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